Da magnetização dos corpos inertes e dos acessórios que se podem empregar para as magnetizações indiretas

211. A ação magnética não se estende somente aos animais e às plantas; os próprios corpos inertes podem ser influenciados.
Apesar da realidade deste fato, que a experiência demonstra, uma asserção desta ordem pode, à primeira vista, parecer contestável, por isso que, se nos dispomos a admitir muito facilmente uma troca de radiações entre os corpos dotados de vida, não vemos absolutamente, à priori, que relações possam existir entre a natureza morta e a natureza viva. Isto procede da idéia que se faz acerca da inércia introduzida na física para explicar o estado negativo e a imobilidade aparente da matéria, velando o conhecimento do movimento universal que mantém o mundo inteiro debaixo da ação de uma mudança lenta, imperceptível aos nossos sentidos, porém constante.
Foram necessários trabalhos modernos sobre o polimorfismo e as cristalizações, para por-se em evidência esta verdade. Os corpos se nos apresentam então unidos entre si, não pela atração, como se havia suposto, mas por uma espécie de coesão recíproca devida a um equilíbrio coletivo. Assim mantidos em suas relações mútuas e constantes, esses corpos estão imersos numa espécie de oceano de movimento serial onde, debaixo das aparências simuladas de atrações e de repulsões, nascem, sob a influência de dispersões e condensações sucessivas, correntes que, longe de se deterem nas superfícies que banham, as envolvem e penetram.
A matéria perdendo, desde então, as propriedades negativas que a inércia lhe empresta, exerce um papel eminentemente ativo: ao movimento ambiente que a cerca e comprime, ela opõe resistências proporcionais aos seus graus de condensação; não é mais uma entidade passiva, simples joguete das forças exteriores coligadas, mas sim uma força virtualmente ativa em antagonismo constante com as outras forças.
Sob a influência das correntes que nascem deste antagonismo, tudo se anima na natureza, a separação estabelecida entre o mundo dos corpos vivos e o dos corpos sem vida cai por si mesma, e a unidade se faz na vivificação universal da matéria hierarquizada e na união das forças coligadas para um mesmo fim. Desaparece a inércia, para dar lugar a uma série infinita de todos os matizes de condensação, e não é mais sob o ponto de vista de sua materialização que cumpre considerar os corpos, mas sob o da faculdade que eles possuem de condensar o movimento em proporções variáveis.
212. Não existem, propriamente falando, corpos inertes na natureza; todos os corpos são, antes de tudo, condensadores de movimento, e é sob este aspecto que eles são influenciáveis pelas nossas radiações.
213. Os corpos magnetizados auxiliam admiravelmente num tratamento os efeitos da magnetização direta:

    • são excelentes intermediários.
Magnetizam-se corpos de qualquer natureza, a fim de empregá-los como acessórios:

    • a água,
    • os tecidos,
    • a madeira,
    • os metais,
    • a cera,
    • o vidro são igualmente bons condensadores das correntes.
214. As magnetizações não mudam em coisa alguma a natureza intrínseca dos corpos; aumentam somente as suas propriedades radiantes. Ativando a energia das correntes que os atravessam (14), estendem-se as propriedades dos corpos, assim como restabelece-se neles as que um acidente lhes tivesse feito perder.
215. Os corpos submetidos à nossa ação magnética restituem, pelo contato, uma parte da energia transmitida; porque a magnetização, dobrando a sua faculdade condensadora ou a sua corrente centrípeta, põe em ação outro tanto de sua faculdade dispersiva ou da sua corrente centrífuga. É esta perpétua tendência ao equilíbrio entre as funções de condensação e as de dispersão, que permitiu considerar indistintamente todos os corpos da natureza como reservatórios da força magnética. (12)
Como nenhuma modificação aparente se manifesta nos corpos quando se os magnetiza, seria difícil verificar o aumento das propriedades destes corpos produzido pela magnetização, se não houvesse um meio de exame. Este meio forneceram-no os sensitivos; os pacientes sensíveis sabem muito bem, no estado magnético, distinguir um objeto magnetizado de outro que o não é. Eis aqui vários exemplos:

Eu tinha um sonâmbulo de extrema sensibilidade; bastava-me magnetizar um objeto qualquer, uma cadeira, um livro, um papel, e deixar este objeto misturado com outros da mesma espécie; nunca o meu sonâmbulo deixou de encontrar o objeto magnetizado no meio daqueles que não o estavam. Se, estando acordado, o acaso levava-o a tocar um objeto que eu houvesse magnetizado fora de sua presença o simples contato desse objeto punha-o instantaneamente no estado magnético.

Muitas vezes repeti esta experiência, e sempre com bom resultado. Antes da chegada do sonâmbulo, eu magnetizava um objeto qualquer visível sobre a mesa ou sobre a lareira, uma caixa de fósforos, por exemplo; toda a vez que, por inadvertência, o sonâmbulo tocava no objeto magnetizado ele girava sobre si mesmo e caia instantaneamente em sono magnético, e o efeito era fulminante!

No estado sonambúlico, os sensitivos vêem sempre a água magnetizada fosforescente. Um dia colocaram uma garrafa d'água magnetizada sobre a mesa, ao lado de uma pessoa que eu tinha por costume por em estado magnético. Era uma pessoa muito fácil de ser influenciada: a simples vizinhança dessa garrafa magnetizada bastou para adormecê-la, e quando tirei-a desse estado, foi necessário remover a garrafa de cima da mesa para que se não reproduzisse a mesma cena. Alguns dias antes, o simples contato de um anel de ouro magnetizado, que eu havia passado para o dedo dessa pessoa sem preveni-la do efeito que podia produzir-se, instantaneamente mergulhara-a no sono magnético.

Estes efeitos inopinados, produzidos por um objeto magnetizado sobre sonâmbulos não prevenidos, dão a prova mais palpável da ação inteiramente física do magnetismo.

Água magnetizada

216. A água é, de todos os corpos inertes, o que mais facilmente se magnetiza e que também comunica melhor a energia de que é portadora.
A água, por si mesma, já é, como o ar, a luz, o calor, um dos elementos primordiais da nossa vida planetária; magnetizando-a, aumenta-se consideravelmente a energia das suas propriedades vitais. Na opinião de todos aqueles que se ocupam de magnetismo sob o ponto de vista curador, a água magnetizada representa um papel muito importante na medicina magnética; de todas as magnetizações intermediárias é a que produz efeitos mais surpreendentes e mais úteis à saúde.
Entre os acessórios dos tratamentos magnéticos, eu encaro a água magnetizada como um dos mais preciosos; empreguei-a muitas vezes, e com a maior vantagem. (Dr. Roullier, 1817)
A água magnetizada é um dos agentes mais poderosos e salutares que se podem empregar; vi-a produzir efeitos tão maravilhosos que eu receava iludir-me, e só pude acreditar depois de milhares de experiências.
Os magnetizadores não fazem muito uso da água magnetizada; entretanto ela lhes pouparia muitas fadigas, dispensariam os seus doentes de vários remédios, e acelerariam a cura se dessem a esse meio todo o valor que merece. (Deleuze)
217. A água magnetizada deve ser empregada como acessório de todo tratamento para auxiliar a ação magnética direta. Receita-se como bebida nas refeições ou nos intervalos; emprega-se também em banhos e loções.
218. Magnetiza-se a água da maneira seguinte, conforme os recipientes que a contêm:


  • Para magnetizar um copo d'água, toma-se com a mão esquerda, e com a direita faz-se imposições e passes na superfície do líquido e ao longo das paredes do copo.
  • Para magnetizar uma jarra ou uma garrafa d'água, deve-se colocá-la desarrolhada na mão esquerda, e fazer com a mão direita imposições e passes na entrada do vaso e ao longo de suas paredes; se o recipiente for muito grande, de modo que não se possa tê-lo entre as mãos, coloca-se-o sobre uma mesa diante de si, envolve-se-o do melhor modo que for possível com os dedos abertos, depois faz-se em seguida imposições e passes com as duas mãos na entrada do recipiente e ao longo das suas paredes.
  • Para magnetizar um banho, passa-se a mão aberta pela superfície da água, duma extremidade à outra da banheira, mergulha-se-a durante alguns minutos; depois, estende-se as mãos fora da água, para o centro, fazendo passes sucessivos muito lentos sobre a superfície da água.

    Proporciona-se o tempo da magnetização ao volume de água e ao tamanho do recipiente. São necessários de dois a cinco minutos para magnetizar um copo ou uma garrafa, e cerca de dez minutos para magnetizar um banho.

219. Os efeitos produzidos pela água magnetizada são múltiplos, às vezes são até absolutamente opostos; alternativamente tônica ou laxativa a água magnetizada fecha ou abre as vias de eliminação conforme as necessidades do organismo, pois toda a magnetização direta ou indireta tem por fim o equilíbrio das correntes, e conseguintemente o das funções.

    • O efeito será tônico, quando houver excesso nas funções de eliminação;
    • será laxativo, quando as funções de condensação forem exageradas.
A água magnetizada possui a preciosa vantagem de substituir qualquer espécie de purgantes e de agir naturalmente nas constipações mais recentes. Tomada regularmente, em jejum e nas refeições durante muitas semanas seguidas, acaba quase sempre restabelecendo o equilíbrio das funções e triunfando da inércia intestinal a mais rebelde.
Por este meio, restabelece o curso normal das fezes em pessoas impossibilitadas que permaneciam no leito há muitos anos, sem que conseguissem defecar, a não ser por meio de purgantes e clisteres.
Algumas vezes, os efeitos purgativos da água magnetizada são muito pronunciados.
No tratamento de um reumatismo articular agudo, não somente as bebidas magnetizadas fizeram cessar uma constipação renitente, mas ainda provocaram trinta e uma dejeções abundantes e infectas, em menos de cinco dias. Longe de enfraquecerem o doente, elas trouxeram uma melhora tal em seu estado, que ele pode levantar-se, apesar de não ter tomado alimento durante os dez dias que esteve no leito.
No tratamento de um tumor do ouvido, complicado de uma hemiplegia da face, a água magnetizada produziu, no espaço de dezoito dias, três a oito evacuações diárias: estas dejeções líquidas não fatigaram de maneira alguma o doente, e livraram-no definitivamente do corrimento purulento do ouvido, primeira causa da hemiplegia, que desapareceu por sua vez cinco meses depois.
Vi muitos doentes, cuja saúde tinha sido completamente arruinada por diáteses graves, recuperarem a saúde por uma série de emissões alvinas abundantes e críticas que expulsavam do organismo todos os seus elementos mórbidos; um deles, graças ao uso da água magnetizada, teve durante três anos, de três a cinco evacuações em vinte e quatro horas.

    • Se a água magnetizada tomada internamente, favorece as digestões e secreções, impede o retorno dos acessos nas febres intermitentes e pode reconstituir o organismo por completo, como se fora o melhor dos fortificantes;
    • o seu emprego externo em loções e compressas não tem menos efeitos soberanos, para as feridas, os dartros, as queimaduras, as erisipelas e as moléstias de olhos.

Vidro magnetizado

220. Depois da água, é o vidro o corpo que melhor se magnetiza e que melhor pode preencher o papel de intermediário entre o magnetizador e o doente.
Os sonâmbulos têm para com o vidro ou uma tendência, ou uma repulsa notável. Em geral, entretanto, procuram-no com muito açodamento como se fora a mão do magnetizador, e justificam este aforismo do Dr. d'Eslon: uma garrafa colocada no epigástrio faz o mesmo efeito que a mão do magnetizador. (Aphor 24)
221. O vidro parece possuir propriedades inteiramente especiais de condensação, e, de todos os corpos inertes, é ele que atua magneticamente sobre o organismo com maior intensidade.
Quando se quer concentrar as correntes e atuar com mais atividade sobre um órgão afetado, magnetizam-se campânulas, placas ou bocais de vidro para cobrirem a parte doente.
Nas moléstias de olhos, magnetizam-se os vidros das lunetas ou os óculos.
Grande número de magnetizadores entre os quais o Sr. de Puységur, o Dr. Roulier, Aubin Gauthier, preconizaram o emprego de medalhões de vidro, que eles magnetizavam e faziam trazer suspensos numa fita ao pescoço dos doentes. A aplicação dessas placas de vidro sobre o estômago e sobre o coração era para eles de um grande auxílio a fim de acalmarem as dores, as palpitações e desfazerem obstruções. Haviam notado que o vidro magnetizado prende-se à pele, enquanto que aquele que não é, deixa de lhe aderir.
222. Magnetiza-se uma placa ou um disco de vidro soprando quente por cima e fazendo passes em sua superfície; faz-se também imposições, cercando o disco com os cinco dedos de uma das mãos, e colocando os cinco dedos da outra mão, reunidos em ponta ou em feixe.
Magnetiza-se um bocal ou qualquer outro corpo oco, introduzindo nele uma das mãos aberta, de modo a sustentá-lo sobre a ponta dos cinco dedos, e com a a outra magnetiza-se por meio de passes.
Magnetizam-se lunetas, colocando o polegar sobre os vidro e deixando-o aí apoiado por alguns instantes faz-se em seguida passes ao longo dos ramos, do centro para cada extremidade.

Alimentos, metais e objetos diversos magnetizados

223. Qualquer objeto pode ser magnetizado e armazenar os eflúvios magnéticos, a fim de servir de intermédio às magnetizações indiretas; empregam-se para isso tecidos, alimentos, metais, etc.
224. Magnetiza-se um lenço, um pedaço de flanela, um retalho de algodão, soprando quente sobre eles e conservando o tecido desdobrado na mão esquerda, enquanto com a mão direita se fazem passes ou apresentam-se os dedos em ponta.
225. Quando os doentes manifestam repugnância por certos pratos ou bebidas que lhes poderiam ser úteis, ou porque o estômago esteja preguiçoso e degira mal, magnetizam-se todos os alimentos a fim de facilitar-lhes a ingestão e digestão.
Para magnetizar os alimentos sólidos, apresentam-se os cinco dedos reunidos em ponta alguns centímetros acima do vaso que os contêm, e termina-se a operação por alguns passes.
226. Quanto aos objetos metálicos, ainda que bons condensadores, não podem ser de uso corrente como a água, o vidro, e os panos; por isso que, possuindo propriedades especiais, por si mesmos influenciam mui diversamente o organismo em razão das idiossincrasias e dos temperamentos.
O contato do ferro é geralmente insuportável a todos os sonâmbulos; este contato os inquieta, irrita e queima. O ouro, que por si mesmo possui uma virtude tão calmante, dissipa as dores locais e resolve as contrações, e torna-se para certos sensitivos um excitante que provoca contrações e espasmos.

O Som

227. Toda a emissão de som favorece a ação magnética, com a condição, que os sons sejam harmônicos e não venham surpreender o sonâmbulo com um ruído dissonante de um choque.
O vento, o farfalhar das folhas, o murmúrio dum regato, a queda duma cascata ou de um repuxo, auxiliam a ação magnética e concorrem para o sono_magnético, se o doente for predisposto a isso. (Mesmer, Aph. 164)
228. A música, principalmente quando melodiosa e suave, tem uma influência enorme sobre os nervos, produz muitas vezes crises úteis e o êxtase; a sua potência expansiva pode, em certos casos, ajudar a resolver favoravelmente os mais graves estados críticos.
Tive muitas vezes ocasião de averiguar a benéfica influência da música e principalmente do canto, nas crises produzidas pelos tratamentos magnéticos. Tive especialmente uma doente muito interessante, a senhorita Luiza C., afetada de atrofia muscular progressiva, em quem o tratamento determinava crises violentas bem freqüentes, e que só a música conseguia dominar. Era bastante uma de suas amigas, que assistia às sessões e possuía bem excelente timbre de voz, começar a cantar em voz baixa a bela romanza [*] de Paulo e Virgínia "O pássaro se vai", para que imediatamente toda a exaltação diminuísse e a calma se restabelecesse. Uma profunda interrupção se dava, lágrimas inundavam o seu rosto, e a jovem doente, subitamente acalmada, seguia numa espécie de êxtase todas as inflexões da voz da sua amiga, que parecia conservá-la numa magia invencível.
229. Qualquer ruído ou som brusco e violento, tudo o que tende, em uma palavra, a surpreender o sonâmbulo, é uma causa de perturbação que pode apresentar perigo. Estes meios, em todo o caso, nada têm de curativos, e devem ser prudentemente afastados do tratamento; as pancadas de tan-tan, que mergulham brutalmente os sonâmbulos no estado cataléptico, só serviram para maravilhar a multidão por efeito teatral preparado.
Em geral, os sonâmbulos assimilam muito melhor os sons harmônicos do que os ruídos; na maioria, ficam completamente estranhos aos ruídos que os cercam e percebem sons harmônicos os mais longínquos. Vi sonâmbulos não se perturbarem de nenhum modo com as conversações, entradas e saídas de pessoas, portas que se abriam e fechavam, gritos, latidos de cães, e de repente saírem de sua letargia para prestarem atenção aos sons duma música ou de cantos que nenhum dos assistentes percebia desde logo, por causa da grande distância.
230. Podem-se tirar muito bons efeitos da magnetização acústica, num tratamento particular; porém, este gênero de magnetização não pode ser empregado no tratamento em comum, porque certos doentes experimentariam com ele um benefício incontestável, enquanto que outros ficariam profundamente perturbados.
Os instrumentos mais favoráveis ao desenvolvimento da ação magnética são, depois da voz humana, a flauta, a harpa, a cítara. Mesmer, em suas sessões, empregava freqüentemente este último instrumento.
Diversos magnetizadores pretendem que os sons que partem de um instrumento magnetizado fazem mais efeito num doente, do que os de um instrumento que não o esteja; mas nunca tive ocasião de fazer experiências a este respeito.

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[*] Cançãozinha histórica.