____Guerras
de palavras ! Guerras de palavras ! Ainda não basta o sangue que tendes feito
correr ! Será ainda preciso que se reacendam as fogueiras? Discutem sobre
palavras: eternidade
das penas, eternidade dos castigos. Ignorais então que o que hoje entendeis
por eternidade
não é o que os antigos entendiam e designavam por esse termo? Consulte o
teólogo
as fontes e lá descobrirá, como todos vós, que o texto hebreu não atribuía
esta significação
ao vocábulo que os gregos, os latinos e os modernos traduziram por penas sem-fim,
irremissíveis.
Eternidade dos castigos corresponde à eternidade do mal. Sim, enquanto existir
o mal entre os homens, os castigos subsistirão. Importa que os textos sagrados
se interpretem
no sentido relativo. A eternidade das penas é, pois, relativa e não absoluta. ____Chegue
o dia em que todos os homens, pelo arrependimento,
se revistam da túnica da inocência e desde esse dia deixará de haver gemidos
e ranger de dentes. Limitada tendes, é certo, a vossa razão humana, porém,
tal como
a tendes, ela é uma dádiva de Deus e, com auxílio dessa razão, nenhum homem
de boa-fé
haverá que de outra forma compreenda a eternidade dos castigos. Pois que
! Fora necessário
admitir-se por eterno o mal. Somente Deus é eterno e não poderia ter criado o
mal
eterno; do contrário, forçoso seria tirar-se-Lhe o mais magnífico dos Seus
atributos: o soberano
poder, porquanto não é soberanamente poderoso aquele que cria um elemento destruidor
de suas obras. ____Humanidade! Humanidade! Não mergulhes mais os teus tristes
olhares
nas profundezas da Terra, procurando aí os castigos. Chora, espera, expia e
refugia-te
na ideia de um Deus intrinsecamente bom, absolutamente poderoso,
essencialmente
justo.
PLATÃO.[9a - página 464 questão 1009]
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